Apenas alguns minutos...


Estava em algum ponto entre dois andares e uma parede grotesca, com uma leve “mão de cal”, me esmagava para dentro do elevador. Sentia uma espécie de respeito por aquele intervalo de puro concreto. O que era, rotineiramente, um pequeno lampejo branco visto através da minúscula janela retangular, que normalmente só nos chamava atenção quando queremos ver em qual andar paramos, era, agora, aquela parede obscena aberta e eterna à minha frente.
O suor não me deixava raciocinar, ia amolecendo meu corpo já em estado de alerta, há quantos minutos me encontrava dentro do elevador, não sabia. Todos meus nervos entregues ao medo, crescendo, crescendo. Não sei por que não conseguia parar de passar a mão no cabelo que, encharcado pelo suor, começava a colar na cabeça. Ainda havia luz, e isso me animava um pouco... Muito pouco. Precisava de um mínimo de frieza, respirei fundo. O gesto automático de enrolar o cabelo atrás, na nuca, talvez me faça pensar em alguma saída inteligente e, como em um passe de mágica, me lembrei do celular... todo o conteúdo de minha bolsa estava no chão em menos de um minuto. Beijei nervosamente meu celular... mas, a operadora que vivia alardeando seus sinais de freqüência, não pegava naquele elevador... Acho que desmaiei, porque não me lembro de ter deitado no chão e, de repente, lá estava eu, pernas encolhidas, meio de lado, mãos jogadas ao longo do corpo, e os objetos pessoais espalhados à minha volta. Sentei-me rapidamente e enfiei tudo de volta na bolsa, o calor era, agora insuportável, começava a tremer e senti meus olhos verterem lágrimas nervosas, gratuitas e abundantes. Só faltava essa, presa num elevador, atrasada para a aula e agora, com a cara inchada de tanto chorar, isso sem contar com o cabelo todo engordurado.
Ouvi vozes, a conversa não chegava nítida aos ouvidos, mas, com certeza, alguém conversava acima de mim, abaixo ou ao lado. Que importava? Levantei-me e comecei a gritar, a esperança renovando minhas forças e uma boa dose de adrenalina trazendo de volta cor, brilho e som para buscar por socorro e sair daquela situação. A voz, então, afastou-se e me sentei insensível, incrédula. Era só, naquele momento, única, dentro daquele útero quadrado, pendurado por cabos.
Uma nova onda de pânico começou a subir por minhas costas, instalando-se na nuca. Um suor frio impregnava o tecido sintético da blusa. Tudo colado, tudo incomodando. Conscientemente sabia que mais cedo ou mais tarde sairia dali, mas a sensação de falta de escolha me mortificava. Calculei ficar ali até alguém perceber que o elevador estava quebrado, mas, como no prédio havia três... E se o síndico fosse desorganizado? E se demorasse dias e dias? Não. Isso estava fora de cogitação. Alguém notaria. Ficaria no máximo algumas horas. Mas quantas?
Em algum momento me lembrei das crises de enxaqueca, quando estava totalmente entregue à dor e não podia fazer mais nada a não ser esperar que o remédio fizesse efeito. Que remédio? Deitei-me no chão. Fechei os olhos. Queria, naquele momento, economizar minhas energias para não sentir fome ou vontade de ir ao banheiro ou qualquer necessidade urgente e básica que não pudesse ser atendida naquele lugar. Fazer o quê? E me conformei em esperar, como nas crises de dor de cabeça. Na escuridão autoimposta, descobri que um formigueiro se movimenta à minha volta. Podia escutar fragmentos de conversas nos corredores, os elevadores subindo e descendo, o choro manhoso de alguma criança, o espirro abafado por uma concha de mão. Conseguia ouvir os ruídos daquele prédio, como se fosse o poro abafado de um tijolo coberto pelo cimento, eu era parte daquele universo. Podia escutar o que se passava por dentro de cada sala: as consultas; os carimbos martelando duplicatas nos escritórios; sentia a vibração do rio de esgotos e água subindo e descendo pelos canos; das brocas dos dentistas e bocas abertas sedentas de medo. E o medo me trazendo de volta.
Fiquei nesse ciclo de senta, levanta, deita, chora, e lamenta-se. Esmurra, despeja todo conteúdo da bolsa no chão e guarda tudo, meticulosamente, de volta. Desafiando meu controle emocional a cada investida de um ataque de nervos, navegando em mar agitado e nauseante.
Como tudo voltou a funcionar, não me lembro, só me recordo de sair apressadamente empurrando a porta com força. Os passos incertos e mãos repetidamente nos cabelos. O escuro úmido das escadas me acolhendo por longos minutos, até que pudesse regressar a mim, e não deixar mais nem um resíduo sequer, do meu medo, pendurado no vazio, entre os andares.

Comentários

  1. Foi você que ficou presa?
    Eu já passei por essa experiência nada agradável, foi em Caldas Novas. O elevador do hotel parou do nada. A diferença é que estava lotado até o tubos. Não cabia uma mosca, e o calor também era insuportável. Foram mais de 20 minutos para chegar o socorro e abrir a porta.

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