O conto e o mercado: preconceito ou desinteresse?






Não consigo entender por que o conto não é considerado um gênero literário de apelo comercial. Sempre que converso com amigos escritores ou editores a frase é sempre a mesma: “Você escreve contos? Hum, o conto é difícil...” Com o tempo fui decifrando o enigma do porquê de nenhuma editora responder positivamente, às minhas diversas investidas e tentativas de publicação.

Com os horizontes mais nítidos, agora, consigo entender. O conto não vende! Pronto! Existe uma barreira, um preconceito intransponível, a ponto de várias editoras simplesmente, não cogitarem publicar o gênero!

O contista essencialmente, escreve pelo puro prazer de narrar uma história. Habita, nesse impulso, uma ideologia quase quixotesca, pois, ao renunciar a escrever pragmaticamente um romance histórico, por exemplo, sem dúvida um gênero mais sedutor - há um público sempre curioso com extensas biografias de figuras célebres - por outro lado, o contista preserva sua liberdade de escrever o que deseja.

Percebo que, assim como preconceitos inexplicáveis surgem e se transformam em indiscutíveis verdades coletivas, o livro de narrativas curtas está inserido nessa nebulosa curiosidade folclórica. Algumas pessoas não gostam de gatos e nem sabem a causa desse mal estar, pois nunca foram agredidas pelo dengoso bichano. Algumas até já foram mordidas por cachorros, mas é o gato quem rejeitam...

Por outro lado e curiosamente, a arte da narrativa breve é estimulada por meio de periódicos concursos,  (eventos que mantém o gênero vivo!), as oficinas de criação de texto – aliás, em quase todas as oficinas de romance é pré-requisito o envio de um conto com até três páginas (!!!???)

Ao contrário do que se imagina, o conto não é fácil de se escrever, sua construção prioriza a concisão, a coesão, muito mais que a suposta coerência de uma narrativa linear. O conto não precisa ser coerente, precisa ser curto e impactante! O conto tem de ser vencido por nocaute!

Segundo Edgar Alan Poe, “o conto precisa causar um efeito singular no leitor; muita excitação e emotividade”.

Um livro de contos pode ser lido enquanto esperamos para entrar em uma consulta, no percurso do metrô ou até mesmo enquanto esperamos o filho brincar no parquinho. É expresso, é dinâmico e pode mudar a vida do leitor apenas com algumas dezenas de caracteres.

Acredito que a falsa ideia de facilidade, de que seria simples escrever um texto breve, influencia o leitor que não se arrisca em outras vertentes, geralmente lendo por indicação ou por excesso de oferta de um mesmo “produto”. Enquanto o mercado editorial "dá as cartas" nós que escrevemos por prazer, publicando "muito" ou não, levamos a literatura adiante.

Comentários

  1. Parabéns, Joana. Subscrevo suas palavras. Editores, leitores, personagens da cena intelectual desse país e, mesmo, alguns escritores têm preconceitos enraizados em relação às micronarrativas. Além do aspecto financeiro, isso acontece também no plano cultural, isto é, parece que não houve (e não há!) uma educação para fomentar a divulgação e o consumo de contos e micronarrativas em geral. Mas vamos em frente!

    Abraços.

    Fernão Gomes

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  2. Obrigada Fernão! Não me conformo com esse status no qual o livro de conto se "encaixa"!
    Se é preciso divulgar... vamos à luta!
    Beijos.

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  3. Hélio, me desculpe. Não apaguei seu comentário! O Blogger ficou absolutamente louco por três dias e apagou meu antigo post e com ele todos os comentários!
    Beijos

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  4. Argumentos como este, aqui tão bem sedimentados, é que mudarão a cabeça dos que olham para literatura como o produto que lhes darão lucro e não como a arte de encantar a ser divulgada.

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